O Fantástico localizou o torcedor corintiano
que teria detonado o sinalizador naval responsável pela morte do torcedor
boliviano. Ele será apresentado nesta segunda-feira à Justiça por orientação do
advogado da torcida organizada Gaviões da Fiel. Sempre ao lado da mãe, o jovem
falou com exclusividade ao repórter Valmir Salaro. Ele tem 17 anos, é o terceiro
dos seis filhos de uma família humilde. Quase quatro dias depois da tragédia na
Bolívia, o garoto está novamente ao lado da mãe. Ele decidiu contar a versão
dele para o que aconteceu na noite da última quarta-feira. Como é menor de
idade, não pode mostrar o rosto.
Repórter: O que
aconteceu?
Jovem: Bom, naquele exato momento lá que o
sinalizador disparou, nós estávamos comemorando o gol. Eu trouxe o sinalizador
na minha mochila, estava dentro de uma sacola, eu fui acender, para mim, era
como se fosse um igual aos outros. Eu tirei a tampinha em cima, puxei a cordinha
embaixo e não aconteceu nada. No momento que eu fui puxar de novo, eu estava
manuseando, não sabia como manusear, puxei pela segunda vez e disparou, foi para
a torcida boliviana.
Repórter: Você fez mira pra
atingir a torcida?
Jovem: Não, não fiz nenhum tipo de mira.
Estava apoiado na minha mão assim. Para mim só ia acender e pronto, não sabia
que o negócio ia sair voando assim ou algo parecido.
Repórter: Você viu quando
acertou no menino?
Jovem: Não, não. No intervalo do jogo, eu
perguntei para os policiais lá se tinha machucado alguém, os policiais falaram
que estava tudo bem.
Mas a torcida adversária indicava que algo
grave tinha acontecido.
Jovem: Começaram a gritar
assassino, falou que nós íamos morrer. Eu perguntei para o policial lá, ele
falou: ‘Não, está tudo bem e o menino está bem’.
O adolescente conta que esperou a partida
terminar.
Jovem: Quando acabou o jogo,
nós fomos embora. Nós fomos lá para fora do estádio, esperamos nosso ônibus
chegar e embarcamos no ônibus. Só fui ter certeza que ele morreu no ônibus
mesmo, só na volta mesmo, que mostraram lá para mim, começaram a falar, entraram
na internet. Depois daquele momento, eu falei: ‘minha vida acabou, o que eu vou
fazer?’ Eu matei uma criança de 14 anos de idade.
Logo depois do jogo, 12 torcedores brasileiros
foram detidos. Mas o jovem que assume ter feito o disparo não estava entre
eles.
Jovem: Eu fiquei sentado e os
policiais começaram a prender o pessoal que estava lá, mas eles não vieram em
mim.
Repórter: E você também não se
apresentou como sendo o torcedor que fez o disparo?
Jovem:
Não, não porque eu fiquei com medo na hora mesmo de alguma coisa, eu fiquei com
medo, não sabia o que fazer, para mim o garoto não tinha morrido, eu pensei que
os meninos iam ser soltos no final do jogo.
Ele diz que foi orientado por integrantes da
Gaviões da Fiel a não procurar a polícia, na Bolívia.
Jovem: Eu perguntei opinião se
eu podia me entregar lá para o pessoal no lugar dos meninos. O pessoal me
recomendou: ‘Não, é melhor não se entregar porque nós estamos na Bolívia, você
veio com a gente, você é nossa responsabilidade’.
Repórter: Você está
confessando que fez o disparo do sinalizador porque realmente você fez isso ou
para proteger alguém da torcida?
Jovem: Não, não protegi
ninguém não. Eu só quero assumir meu erro mesmo. Porque não é certo as pessoas
pagarem por uma coisa que não fizeram, se eu tivesse no lugar delas, também não
queria pagar com uma coisa que eu não fiz, ficar preso injustamente.
O adolescente contou que faz parte da torcida
organizada há dois anos e que não conhecia os torcedores que ficaram
presos.
Jovem: Eu conheço eles de
vista.
O jovem diz que comprou o sinalizador naval na
Rua 25 de março, área de comércio popular em São Paulo.
Jovem: Fui comprar uns jogos
do videogame lá, eu vi um cara vendendo, eu falei: ‘vou comprar um sinalizador
para levar para o jogo’.
Para ele, o sinalizador seria usado para chamar
a atenção dos outros torcedores da Gaviões.
Jovem: Quis buscar um espaço,
quis mostrar que eu que fiz aquilo lá, quis fazer uma festa para o Corinthians.
Eu amo o Corinthians.
O advogado da torcida organizada Gaviões da
Fiel diz que o adolescente vai ser encaminhado à Justiça na tarde de segunda.
“Ele vai ser apresentado juntamente com a mãe dele, mas o juiz da vara Da
Infância e Juventude provavelmente aplicará algum tipo de medida
sócio-educativa, nesse primeiro momento, e entregará a guarda desse menor à mãe,
que responsável e representante legal dele”, afirmou o advogado Ricardo
Cabral.
Segundo a especialista em direito internacional
Maristela Basso, os dois países têm acordo de extradição, mas isso não se aplica
a menores porque Brasil e Bolívia seguem a convenção da ONU sobre os direitos da
criança e do adolescente.
“Se trata de uma criança, um menor para não
dizer uma criança, e, portanto, ele é submetido a uma legislação especial, tanto
aqui quanto na Bolívia, muito semelhante a legislação, protetiva da criança”,
ressalta Basso.
O jovem brasileiro pode ter que prestar
serviços comunitários ou ficar apreendido por no máximo três anos.
Repórter: O que você diria pra
família do garoto?
Jovem: Primeiramente, perdão mesmo. Não
só para a família do Kevin, mas para a família dos meninos que estão presos lá
também.
A mãe do jovem diz que, se o filho não se
apresentasse como autor do disparo, ela mesma o entregaria à polícia.
Mãe do jovem: Ele sabe, ele me
conhece, ele sabe que eu entregaria ele.
Repórter: Se a
senhora pudesse ter contato com a família desse garoto, o que a senhora diria
para a família?
Mãe do jovem: Eu pediria perdão à mãe, eu
sei a dor que ela está sentindo. Eu sei que jamais, é uma coisa que mãe nenhuma
perdoa, mas eu pediria.
Repórter: A senhora perdoaria se a
situação fosse ao contrário?
Mãe do jovem: Eu acho que
não.
Repórter: Como você se sente
agora?
Jovem: Eu me sinto a pior pessoa do mundo. Não sei
mais o que fazer da minha vida. Me arrependo amargamente.
Depoimento tem algumas
lacunas
O menor H.A.M. disse que comprou o sinalizador na 25 de
Março, mas não especificou quantos. Outros nove artefatos com o mesmo número de
série daquele que matou Kevin estão com a polícia boliviana, encontrados com os
12 corintianos detidos em Oruro. Cada um custa cerca de R$ 100,00. Ele disse
também que, após o disparo, continuou vendo o jogo, mas imagens da TV boliviana
mostram o suposto autor correndo em direção a uma das saídas da
arquibancada.